Igreja Paroquial de Flamengos. Ilha do Faial.

         Reunimo-nos neste domingo para celebrar a Eucaristia e nela viver a Ressurreição de Jesus Cristo e para testemunharmos a nossa alegria pela dedicação desta nova Igreja de Flamengos que, após a derrocada motivada pelo sismo de 1998, com muito esforço e generosidade se foi erguendo até que por fim nos reconhecemos mais comunidade cristã e deste modo prestamos acção de graças ao Senhor pelos Seus benefícios.

         Ressoa em nós a Palavra do Livro do Apocalipse que fundamenta e fortalece a nossa fé ao dizer «Não temas. Eu sou o Primeiro e o Último, o que vive. Estive morto, mas eis-Me vivo pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da morte e da morada dos mortos».

Na verdade somos comunidade porque fomos regenerados no baptismo, fazendo a experiência da passagem da morte para a vida, mergulhando o homem velho nas águas do baptismo e ressurgindo homem novo. Somos comunidade porque renascemos para uma vida que nos vem de Jesus Cristo ressuscitado e que nos faz pessoas comunitárias a viver a comunhão e a partilha fraterna.

Mas a comunidade cristã tem algumas prerrogativas e estas encontram-se bem delineadas no Evangelho. O episódio que nos narra o encontro de Jesus Cristo Ressuscitado com os seus Apóstolos começa por dizer que estamos no primeiro dia da semana, isto é o domingo. Sucessivamente, sempre que Jesus Cristo Vivo se manifesta à comunidade apostólica, refere-se que estamos no domingo, o primeiro dia da semana.

Desde logo, sublinha-se a importância da vivência do domingo. Este não é um dia igual aos outros, pelo contrário é o dia da Ressurreição, da nova criação, o dia da experiência comunitária. Sem a valorização do domingo como o primeiro dia da semana, a experiência cristã em Jesus Cristo vivo e ressuscitado fica diminuída ou mesmo posta em causa.

Se recorrermos a uma outra passagem segundo a qual Jesus, na tarde do primeiro dia da semana, se coloca no caminho de Emaús e uma vez à mesa Ele se revela ao partir do pão, então, reconhecemos um outro elemento para viver a ressurreição de Jesus Cristo, a Eucaristia. A comunidade que vive, nasce e se alimenta da Eucaristia.

Mas continua o texto do Evangelho dizendo que Jesus se colocou no meio dos seus Apóstolos e soprando sobre eles lhes afirma que todo o poder Lhe foi dado no Céu e na Terra e por isso, transmite-lhes esse mesmo poder de reconciliar a humanidade.

O gesto de soprar lembra-nos o mesmo gesto de Deus no inicio da criação com o qual lhe confere a vida divina proporcionando à criatura humana a participação na vida divina. Agora o Filho de Deus, com o mesmo poder do Pai, tendo realizado a redenção da criação pela sua morte e ressurreição, transmite a vida nova que faz dos Seus Apóstolos uma nova criação.

Deste modo, todos os membros da comunidade cristã que participam na Eucaristia são pelo baptismo novas criaturas e nelas Jesus Cristo quer iniciar uma nova criação.

Sim, caros cristãos de Flamengos, Jesus Cristo quer fazer de nós hoje o inicio de uma nova criação no meio de um mundo e de uma cultura que teima em continuar a viver no homem velho sujeito às suas amarras e prisões.

Por último, refira-se que em todas as manifestações do Ressuscitado está presente o envio e a consequente missão de testemunhar a vida nova. Deste modo, reconhecemos que a missão e o testemunho cristão fazem parte imprescindível da experiência de Cristo Ressuscitado.

Para reforçar a importância da comunidade para fazer a experiência do Ressuscitado, o Evangelho refere que Tomé não estava com eles e por isso não acredita no que lhe relatam acerca da experiência que tinham de Jesus Ressuscitado. Mas este facto leva a reconhecer que após o encontro com Jesus Cristo Vivo surge a profissão de fé que integra e encaminha todas as dúvidas e interrogações da razão e se prostra em adoração daquele que o ama. Somos uma comunidade confessante da fé em Jesus Cristo Ressuscitado.

Caros Cristãos, recapitulemos os elementos necessários para fazer uma verdadeira experiência da ressurreição de Jesus Cristo, Vivo e interpelante. Reconhecer que somos resgatados do pecado, somos edificados em novas criaturas, somos constituídos em comunidade de discípulos, participantes activos da Ceia Pascal, a Eucaristia, assumimos a missão de ser testemunhas de Jesus Cristo, em comunidade professamos a fé em Jesus Cristo vivo e interpelante.

Neste domingo, na celebração da dedicação desta nova Igreja estamos perante um sinal eloquente da comunidade cristã. O edifício é sinal da comunidade que se edifica permanentemente na fé, na esperança, no amor e partilha fraterna, e na missão de ser testemunha de Jesus Cristo.

Pela consagração deste espaço propomo-nos elevá-lo até à sua condição de presença sensível de Deus entre os homens. Este não é um local igual a outro porque aqui habita Deus. Aqui podemos encontrarmos com Ele, viver a profundidade da doacção de Jesus Cristo por nós expressa nos sacramentos.

É sinal da comunidade que se reúne para escutar a Palavra, para celebrar os mistérios da fé, para fortalecer os gestos da comunhão fraterna e para se fortalecer para a missão.

Por isso, o templo é sinal da comunidade viva que também ela se edifica constantemente e, para usar o que aqui aconteceu, mesmo quando contra ela se infringem os ventos demolidores do mal, ela sabe onde colocar os seus alicerces e os seus fundamentos para não sucumbir. A rocha firme sobre a qual se deve edificar a comunidade é Cristo.

Em atitude de reconhecimento não só pelo esforço dispendido pela comunidade de Flamengos mas também pelas autoridades públicas, nomeadamente pela sensibilidade e determinação do Governo Regional, na construção deste templo, reconhecemos a abertura da comunidade cristã ao mundo em que vive e o dar as mãos por todos os intervenientes da sociedade para a edificação de uma cultura mais digna do ser humano.

Permita-me que vos deixe um novo apelo. Se foi difícil e demorada a edificação deste edifício, sinal da comunidade, é mais continuada e nunca terminada a edificação da comunidade dos homens e mulheres. Convido a este novo esforço na construção de uma comunidade viva e fraterna.

Refere-nos a primeira leitura que pelo testemunho de vida dos discípulos de Jesus Cristo muitos outros se deixam maravilhar pela vida nova do Ressuscitado que através deles toca e transforma as suas limitações e sofrimentos. E, deste modo, «cada vez mais gente aderia ao Senhor pela fé, uma multidão de homens e mulheres», e todos eram curados. Sim, pelo nosso testemunho temos a tarefa de curar tantas vidas que ainda não encontraram o sentido para a sua existência.

Termino, implorando d Nossa Senhora Mãe e Rainha dos Açores, aqui invocada como Nossa Senhora da Luz, que abençoe as famílias, as crianças, os jovens, adultos, idosos e doentes, que atenda as suplicas dos nossos emigrantes na diáspora, que nos acompanhe na edificação da nossa comunidade e nos oriente pelos caminhos que levam à evangelização do mundo de hoje.

Amén.

 

+João Lavrador

Bispo de Angra e Ilhas