Igreja de Nª Srª de Fátima. Ponta Delgada.
No inicio do ano académico queremos recomeçar as nossas actividades de pastoral Universitária com a celebração da Eucaristia, centrando-nos, deste modo, no acontecimento salvífico pelo qual Jesus Cristo se entrega a todos nós para se fazer alimento da nossa caminhada humana e cristã.
Neste dia somos inspirados pelo exemplo de Santo Inácio de Antioquia, mártir dos primeiros tempos da vida da Igreja. Ele vive entre o primeiro e o segundo século depois de Cristo. O tempo em que viveu, a sua personalidade, a sua fé e comunhão com Jesus de Nazaré até ao ponto de desejar imitar a Sua paixão e morte para saborear n’Ele a Vida Nova de Ressuscitado, a alegria e coragem que demonstra no seu martirio e como contagiou os seus irmãos com o testemunho da sua vida são inspiradores para nós e para o nosso tempo.
Durante o percurso universitário, a Igreja sente que é seu dever acompanhar toda a comunidade universitária no seu desenvolvimento humano e cientifico, oferecendo-lhe a proposta do humanismo cristão que procura edificar o ser humano á luz da pessoa de Jesus de Nazaré e do Seu Evangelho.
O Papa Bento XVI, na sua carta Enciclica Caritas in Veritate, diz num determinado passo que «a religião cristã e as outras religiões só podem dar o seu contributo para o desenvolvimento, se Deus encontrar lugar também na esfera pública, nomeadamente nas dimensões cultural, social, económica e particularmente política». Com tal finalidade, «a doutrina social da Igreja nasceu para reivindicar este “estatuto de cidadania” da religião cristã». Sem dúvida que «a negação do direito de professar publicamente a própria religião e de fazer com que as verdades da fé moldem a vida pública, acarreta consequências negativas para o verdadeiro desenvolvimento» (nº 56).
Atendendo a que «no laicismo e no fundamentalismo, perde-se a possibilidade de um diálogo fecundo e de uma profícua colaboração entre a razão e a fé religiosa», reconhecemos que «a razão tem sempre necessidade de ser purificada pela fé; e isto vale também para a razão política, que não se deve crer omnipotente». Mas de igual modo «A religião, por sua vez, precisa sempre de ser purificada pela razão, para mostrar o seu autêntico rosto humano».
Na verdade, «a ruptura deste diálogo implica um custo muito gravoso para o desenvolvimento da humanidade» (CV, 56).
Fruto desta inter-relação entre a razão e a fé cristã podemos reconhecer o valor e a sabedoria que se depreendem do testemunho de vida dos mártires que na conquista da verdade sentem-se atraídos, através do amor e da entrega total, até à fonte donde dimanam todos os bens transcendentes que são desejados pela inteligência humana, da bondade, da beleza, do amor e da verdade.
Sem dúvida, realizar esta conquista exige sair de si mesmo e despojar-se para alcançar algo de novo que só Jesus Cristo poderá oferecer com a entrega da Sua pessoa.
Entendemos assim as exigência dos Evangelho que nos foram proclamadas, as quais, a partir da imagem do grão de trigo que uma vez lançado à terra dá muito fruto, exorta-nos a penetrar na sabedoria que nasce do amor e que nos faz reconhecê-lo como expressão da verdadeira vida que só será plena quando oferecida a Deus e aos irmãos.
Estamos perante algo de difícil de fazer entender aos nossos contemporâneos. De tal modo que S. Paulo vesse forçado a denunciar aqueles que através dos seus comportamentos se manifestam como inimigos da cruz de Cristo e a exortar para que dirija o olhar para o seu testemunho e o daqueles que procedem segundo o modelo que vêm nele.
Perante as dificuldades não hesita em convidar a permanecerem firmes no Senhor.
Santo Inácio de Antioquia e a primeira geração dos cristãos tiveram de enfrentar duas questões complexas que desafiaram a sua fé. A primeira tem a ver com o paganismo reinante, cujo expoente máximo estava na divinização da figura do Imperador; a segunda diz respeito à cultura helenista, de fundamento racional que olha para o cristianismo com certo desprezo.
Erguer-se no meio desta cultura complexa, atrevida, agressiva e desumana exige uma personalidade que se molda na comunhão com Cristo e que não se resigna à situação do mundo e perante as ameaças vai até ao martírio.
Neste sentido, o mundo não mudou muito e nomeadamente o contexto cultural de hoje continua nas nossas universidades como expressão da cultura reinante na nossa sociedade.
Deste modo, no diálogo que a pastoral da inteligência é chamada a estabelecer com todos os que busca a ciência e o saber é da máxima importância o testemunho cristão.
Este apelo de S. Paulo ao dizer «sede meus imitadores» é um desafio permanente na vida da Igreja. Realmente, o Evangelho que atrai terá forçosamente de passar pela vida do Apóstolo. Daí a exigência da fidelidade para que não se desvirtue com as nossas limitações.
O Papa Bento XVI, na sua carta Enciclica Spes Salvi, num dado passo afirma que «a ciência pode contribuir muito para a humanização do mundo e dos povos». E, acrescenta «mas, pode também destruir o homem e o mundo, se não for orientada por forças que se encontram fora dela» (nº 25).
Porque «não é a ciência que redime o homem», na certeza de que «homem é redimido pelo amor», e isto vale já no âmbito deste mundo, «quando alguém experimenta na sua vida um grande amor, conhece um momento de “redenção” que dá um sentido novo à sua vida». Porém, «rapidamente se dará conta também de que o amor que lhe foi dado não resolve, por si só, o problema da sua vida». Dado que «é um amor que permanece frágil» e «pode ser destruído pela morte», então «o ser humano necessita do amor incondicionado» (SS, 26).
Usando ainda as palavras de Bento XVI podemos afirmar que «neste sentido, é verdade que quem não conhece Deus, mesmo podendo ter muitas esperanças, no fundo está sem esperança, sem a grande esperança que sustenta toda a vida (cf. Ef 2,12)». Porém, «a verdadeira e grande esperança do homem, que resiste apesar de todas as desilusões, só pode ser Deus – o Deus que nos amou, e ama ainda agora “até ao fim”, “ até à plena consumação” (cf. Jo 13,1 e 19,30)». Realmente, «quem é atingido pelo amor começa a intuir em que consistiria propriamente a “vida”» (SS, 27.
A universidade tem de tronar-se lugar de dinamização da autentica esperança.
Por isso, só em Deus está nossa libertação e redenção realizada em Jesus Cristo, Seu Filho.
Reconhecido pelo vosso trabalho neste domínio da pastoral universitária, permitam-me que vos encoraje a trabalhar afincadamente no ambiente universitário, estabelecendo o diálogo entre a fé a razão e a proporcionar um verdadeiro desenvolvimento da pessoa oferecendo a luz nova que vem de Jesus Cristo e do Seu Evangelho.
Que não vos falte a criatividade e a sabedoria para elaborarem um programa de actividades que responda às exigências da academia nos tempos em que vivemos.
Imploro de Nossa Senhora, sede de Sabedoria e Mãe e Rainha dos Açores que abençoe a nossa Academia, a sua Equipa Reitoral, os seus professores, alunos e assistentes operacionais, todas as vossas famílias e colaboradores e nos torne próximos daqueles que se sentem mais marginalizados e excluídos e nos conduza pelos caminhos que levam à evangelização do mundo de hoje.
Amen
+João Lavrador, Bispo de Angra e Ilhas dos Açores
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