Matriz. Ponta Delgada.
O Evangelho desta celebração coloca Jesus em Nazaré, na Sinagoga e a receber o Livro do Profeta Isaias onde se lê: «O Espirito do Senhor está sobre Mim, porque Ele Me ungiu. Enviou-Me a anunciar a Boa Nova…».
Configurados a Jesus Cristo, nós sacerdotes teremos forçosamente de realizar os mesmos passos, viver a mesma alegria e depararmo-nos com as mesmas exigências na missão pastoral. Por isso, hoje, no contexto da nossa Igreja diocesana e do mundo actual, somos convidados a deslocarmo-nos até ao local onde Deus nos quer vivificar com a Sua Palavra, renovar na unção sacerdotal e fortalecer na missão evangelizadora.
Começa o texto Evangélico por nos recordar que o «Espirito do Senhor está sobre Mim, porque Me ungiu». Realmente, fomos ungidos pela Graça do Espirito Santo na nossa ordenação sacerdotal para nos configurarmos a Jesus Cristo. Deste modo, pela acção do Espirito Santo toda a nossa pessoa foi transformada em Cristo. Esta unção orientou a nossa inteligência, purificou os nossos sentimentos, fortaleceu a nossa vontade, transformou a nossa sensibilidade, marcou a nossa afectividade pela presença e encontro amoroso de Jesus Cristo.
É precisamente o selo da unção do Espirito Santo que, uma vez transformado o nosso ser, nos faz sintonizar com a comunhão divina, vivida na Trindade do Pai, do Filho e do Espirito Santo e derramada no nosso coração e nos faz saborear de modo único a nossa condição de filhos amados e nesta condição interiorizarmos em nós a Pessoa de Jesus Cristo e d’Ele sermos sinal visível.
É precisamente nesta profunda experiência de comunhão divina que vivemos a alegria do sacerdócio projectando-a no presbitério. Alegria que para ser autêntica terá forçosamente de ser expansiva e partilhada. Deste modo o presbitério diocesano é caracterizado pela vivência da comunhão, da alegria e da partilha segundo o querer de Jesus Cristo e pela acção do Espirito Santo.
Continua o texto Evangélico dizendo «Enviou-Me a anunciar a Boa Nova…» para marcar decididamente de quem nos vem a missão, que tipo de acção pastoral devemos realizar e os critérios que teremos de usar.
A força, os fundamentos, a pedagogia e a fidelidade da acção pastoral recolhem da realidade de sermos enviados por Jesus Cristo todo o seu sentido e finalidade. Por isso, temos de encontrar nas Suas Palavras, nos Seus gestos e no Seu testemunho o nosso ser de sacerdotes fiéis ao mando divino e à realidade do mundo presente.
Não somos nós os autores da missão da Igreja que é a mesma missão de Jesus Cristo. Só na comunhão com Deus e na comunhão com a Igreja, vivida em presbitério estamos capacitados para agir em nome de Jesus Cristo Cabeça da Sua Igreja.
Renovar continuamente a condição de enviados por Jesus Cristo como Seus Apóstolos e escutar permanentemente as condições evangélicas para ser Seu discípulo são fundamentais para uma acção pastoral feita na fidelidade a Deus e ao homem de hoje.
Só nesta interioridade que nos vem da Palavra de Deus, da oração assídua, da vivência profunda dos sacramentos e na experiência do amor fraterno é possível interpretar e discernir os Sinais dos Tempos com os quais o Espirito Santo nos interpela para uma fecunda acção evangelizadora.
O envio que tem a sua origem no mandato amoroso de Jesus Cristo tem a finalidade única a evangelização.
O único mandato de Jesus Cristo dado aos Seus Apóstolos e que determina o desígnio da missão da Igreja é proclamar a Boa Nova a todos os povos. Por isso, a nossa missão sacerdotal não poderá ter outro objectivo que não seja o anuncio e o testemunho da Boa Nova de Jesus Cristo aos homens do nosso mundo.
Deste modo, «os presbíteros são, na Igreja e para a Igreja, uma representação sacramental de Jesus Cristo Cabeça e Pastor, proclamam a Sua palavra com autoridade, repetem os seus gestos de perdão e oferta de salvação, nomeadamente com o Baptismo, a Penitência e a Eucaristia, exercitam a sua amável solicitude, até ao dom total de si mesmos, pelo rebanho que reúnem na unidade e conduzem ao Pai por meio de Cristo no Espírito» (PdV, 15).
Verdadeiramente, «os presbíteros existem e agem para o anúncio do Evangelho ao mundo e para a edificação da Igreja em nome e na pessoa de Cristo Cabeça e Pastor» (Ib., 15).
Há uma responsabilidade acrescida como educadores da fé por parte de nós sacerdotes que temos por obrigação de estar no meio do Povo de Deus, caminhando no interior da comunidade cristã, mas como exemplo de fidelidade a Jesus Cristo e de comunhão eclesial.
Estamos perante a exigência de nos situarmos no essencial da nossa missão que nos orienta para os dinamismos da evangelização no mundo actual e para o apelo a uma renovação e actualização do mistério e da actuação pastoral que exigem de nós desinstalação, abertura interior, redobrada generosidade, anseio para melhor conhecer o mistério de Deus Revelado e da Sua Igreja através da formação permanente que deverá atingir todos os aspectos da nossa vida.
De facto, «a caridade pastoral é aquela virtude pela qual nós imitamos Cristo na entrega de si mesmo e no seu serviço». Verdadeiramente, «não é apenas aquilo que fazemos, mas o dom de nós mesmos que manifesta o amor de Cristo pelo seu rebanho». Assim, «a caridade pastoral determina o nosso modo de pensar e de agir, o modo de nos relacionarmos com as pessoas». E, por isso, «não deixa de ser particularmente exigente para nós» (PdV, 23).
Para sermos fiéis à missão evangelizadora da Igreja no mundo actual não podemos ceder à tentação de estagnarmos ou de nos agarrarmos às seguranças do mundo que nos tiram a liberdade para uma verdadeira acção pastoral renovada. Muito pelo contrário, só numa formação continua, num partilha constante e na busca de métodos sempre novos poderemos manter a frescura e a alegria da primeira hora na acção pastoral a que fomos chamados.
Cuidar da vida espiritual, entendida como unificação de todo o ser do sacerdote como oferta de si mesmo, é fundamental para crescer na missão evangelizadora.
Realmente, «é essencial para a vida espiritual, que se desenvolve através do exercício do ministério, que o sacerdote renove continuamente e aprofunde sempre mais a consciência de ser ministro de Jesus Cristo em virtude da consagração sacramental e da configuração ao mesmo Cristo Cabeça e Pastor da Igreja».
Sem dúvida que «essa consciência não só corresponde à verdadeira natureza da missão que o sacerdote exerce em favor da Igreja e da humanidade, mas decide também a vida espiritual do presbítero que leva a cabo aquela missão» (PdV, 25), já que o Sacerdote não é escolhido por Cristo como uma “coisa”, mas como uma “pessoa”.
Usando as palavras de S. João Paulo II diremos que «trata-se de um ministério que requer do sacerdote uma vida espiritual intensa, rica daquelas qualidades e virtudes típicas da pessoa que “preside” e “guia” uma comunidade, do “ancião” no sentido mais nobre e rico do termo: a fidelidade, a coerência, a sapiência, o acolhimento de todos, a afável bondade, a autorizada firmeza quanto às coisas essenciais, a libertação de pontos de vista demasiado subjectivos, o desprendimento pessoal, a paciência, o gosto pela tarefa diária, a confiança no trabalho escondido da graça que se manifesta nos simples e nos pobres (cf. Tit 1, 7-8)» (PdV., 26).
Deixemo-nos entusiasmar, empenhar e testemunhar a alegria do encontro com Jesus Cristo que renova em nós constantemente a unção da primeira hora da nossa ordenação e nos faz participantes da Sua missão enviando-nos a anunciar a Boa Nova no «hoje» da nossa história.
Imploro do Beato João Baptista Machado nosso padroeiro e modelo de evangelizador e de Nossa Senhora, Mãe e Rainha dos Açores, Mãe dos sacerdotes, que nos acolha no seu regaço materno e nos acompanhe na nossa missão sacerdotal.
+João Lavrador, Bispo de Angra e Ilhas dos Açores