Nossa Senhora dos Anjos. Água de Pau.

«Nossa Senhora, Mãe e Rainha da Humanidade Nova»

 

«O Templo de Deus abriu-se no Céu e a Sua Arca da Aliança foi vista no Templo». Esta visão que S. João nos descreve no Livro do Apocalipse oferece a possibilidade de que a humanidade dispõe para aceder à Revelação total de Deus e usufruir da Salvação que lhe é oferecida.

A Revelação perfeita de Deus dá-se no Seu Filho, a Arca tão enaltecida pelo Povo Biblico é sinal dos novos tempos inaugurados pela Encarnação de Jesus Cristo. Por isso, Maria de Nazaré, por chamamento divino  possui em si mesma Aquele que manifestará a todos os Povos a Salvação que Deus lhes quer oferecer na Sua bondade e na Sua misericórdia.

A Santissima Virgem, hoje celebrada na Sua Assunção gloriosa, associada ao Mistério da Revelação de Deus, chamada e preparada para ser a Mãe do Filho Eterno do Pai, permanecendo firme ao lado Seu Filho na Sua vida terrena e sobretudo no Seu mistério pascal, é feita participante da glorificação do Seu Filho. N’Ela transparece para a humanidade a Vida Nova inaugurada pela Ressurreição de Jesus Cristo. Por isso, bem podemos contemplá-La como a Mãe da Nova Humanidade.

É eloquente a Palavra de S. Paulo, tal como nos é oferecida na segunda leitura,  que nos diz que «Cristo ressuscitou dos mortos, surgiu entre os que morreram como os primeiros frutos da seara». Maria Santissima torna-se participante destes novos frutos da seara beneficiando da ressurreição do Seu Filho.

Maria de Nazaré manifesta a toda a criação e sobretudo à humanidade de todos os tempos o itinerário pelo qual Deus vem ao encontro das aspirações do ser humano e como este poderá alcançar a plenitude da sua vida em Cristo Jesus.

Voltando-nos novamente para o texto do Livro do Apocalipse deparamo-nos com a revelação de um sinal grandioso que é descrito como uma mulher revestida com o Sol e a Lua debaixo dos pés e na cabeça uma coroa de doze estrelas. Realça-se ainda que esta mulher está para ser Mãe. E Ela teve um Filho que há-de reger as nações.

Com esta linguagem descreve-se a missão de Maria de Nazaré no mistério da Encarnação do Filho de Deus.

Porém há um outro sinal e que diz respeito ao dragão que se coloca frente ao Filho de Deus para O destruir.

Estamos perante o mistério de salvação que nos é oferecido pelo Mistério Pascal de Jesus Cristo e do qual Maria Santissima é participante. Mas sobretudo sublinha-se que no palco do mundo, na história da humanidade e na vida da pessoa humana dá-se um verdadeiro combate que exige lucidez, humildade e opções em ordem a deixar-se mergulhar na Vida Nova do Ressuscitado.

Ai da humanidade quando perde o sentido do pecado, da sedução do demónio e da inclinação para o mal. Quando isto acontece perde-se igualmente a consciência e a verdadeira sabedoria acerca da presença de Cristo na História e da Sua intervenção salvadora em favor da pessoa humana em cada tempo.

Impõe-se uma questão fundamental. Não estará na raiz de todos os males do nosso tempo a perda do sentido do pecado e o deixar-se conduzir pelas paixões enganadoras que são manifestação do maligno na vida pessoal e comunitária e na história?

As manifestações do mal são fáceis de identificar e estão constantemente a ser denunciadas nos diversos contextos sócio-cuturais do nosso tempo. Importa ir mais fundo e encarar com fortaleza e sabedoria a origem de todos os males que afectam sobretudo os mais pobres e vulneráveis da nossa sociedade.

Se não nos colocamos frente a frente com a verdade acerca do homem, se não nos aceitamos no drama humano que nos pretende dominar, se não deixarmos desenvolver em nós as verdadeiras aspirações que nos conduzem ao encontro de Cristo que nos traz a salvação, ficaremos sem resposta para a pessoa humana e para o mundo.

Há uma verdade que sobressai da Palavra de Deus e na Solenidade que nos reúne: «Deus tudo submeteu debaixo dos pés de Seu Filho». Ele reinará eternamente.

Nós que somos portadores desta experiência que nos é dada por chamamento divino, tal como aconteceu a Maria de Nazaré, somos impulsionados a correr ao encontro dos irmãos para lhes comunicar esta Vida Nova.

Tal como nos descreve o Evangelho, Maria Santissima, uma vez experimentando a alegria do mistério do Encontro com Deus através do Mistério da Encarnação, sai para ir comunicar este dom àqueles que ainda viviam fechados em si mesmos e, por isso, sem a verdadeira esperança que lhes é comunicada pela presença salvadora de Jesus Cristo.

O testemunho e o anuncio são formas imprescindíveis da experiência cristã e da autêntica fraternidade humana vivida no amor.

A Igreja coloca o seu olhar em Maria de Nazaré e contempla n’Ela a sua missão que brota no encontro com Jesus Cristo. Deste modo, a vitalidade de cada comunidade cristã nasce da comunhão com Jesus de Nazaré que suscita o encontro com os irmãos.

Esta expressão com a qual Santa Isabel saúda a sua prima «feliz daquela que acreditou no cumprimento de quanto lhe foi dito da parte do Senhor» é dirigida permanentemente aos discípulos de Jesus Cristo de modo a reconhecerem e a despertar neles a missão de transformarem a sociedade e a cultura com a Boa Noticia de que são portadores.

A glorificação de Nossa Senhora oferece à Igreja a autêntica força para vencer as dificuldades que entravam a sua missão. Ela sabe que apesar de todos os entraves que a confrontam na sua peregrinação histórica é confortada pela presença de Cristo e pela acção do Espirito que a leva a viver já na esperança a humanidade nova da qual é já fermento e da qual em germen é portadora.

O Evangelho apresenta-nos uma sociedade transformada e uma cultura assente no amor, na generosidade, na partilha e na força dos humildes e dos simples, dos pobres e dos excluídos. Não estamos perante uma utopia não realizável, muito pelo contrário, estamos conscientes da esperança que brota de uma fé consciente e operativa. Esta é a hora da intervenção da força renovadora do amor de Deus que espera acolhimento no nosso coração como o teve no ser de Maria de Nazaré.

Na Vigem Santissima e na Sua Assunção, Deus desperta em nós a concretização de um sonho que persegue a humanidade e que urge responder-lhe para bem da pessoa humana. Está no esforço de cada um de nós e de cada comunidade respondermos a este desafio que Deus nos lança através da Sua Palavra e dos gestos da Sua presença no grito de tantos excluídos e abandonados.

Façamos nossas as palavras do Papa Francisco que nos interpelam dizendo que «há um estilo mariano na actividade evangelizadora da Igreja».

Concretiza sublinhando que «sempre que olhamos para Maria, voltamos a acreditar na força revolucionária da ternura e do afecto». Porque «n’Ela, vemos que a humildade e a ternura não são virtudes dos fracos, mas dos fortes, que não precisam de maltratar os outros para se sentir importantes». Mais ainda «fixando-A, descobrimos que aquela que louvava a Deus porque “derrubou os poderosos de seus tronos” e “aos ricos despediu de mãos vazias” (Lc 1, 52.53) é a mesma que assegura o aconchego dum lar à nossa busca de justiça».

E acrescenta dizendo que «é a mesma também que conserva cuidadosamente “todas estas coisas ponderando-as no seu coração” (Lc 2, 19).

Maria, continua o Papa, «sabe reconhecer os vestígios do Espírito de Deus tanto nos grandes acontecimentos como naqueles que parecem imperceptíveis». Verdadeiramente «é contemplativa do mistério de Deus no mundo, na história e na vida diária de cada um e de todos».

Reconhecemos, em Maria de Nazaré que «esta dinâmica de justiça e ternura, de contemplação e de caminho para os outros faz d’Ela um modelo eclesial para a evangelização»(EG, 288).

Imploramos de Nossa Senhora, Mãe e Rainha dos Açores, aqui chamada de Nossa Senhora dos Anjos que abençoe todas as famílias, as crianças, os jovens, os idosos e os pais, que atenda as preces dos atribulados e desamparados, os pobres e excluídos, proteja os emigrantes e nos encaminhe pelas sendas da evangelização do mundo de hoje.

Amen.

 

+João Lavrador, Bispo de Angra e Ilhas dos Açores