Mensagem na Celebração de Entrada na Diocese de Angra
29 de Novembro de 2015
«A vós a graça e a paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo! Todas as vezes que me lembro de vós, dou graças ao meu Deus, sempre, em toda a minha oração por todos vós. É uma oração que faço com alegria, por causa da vossa participação no anúncio do Evangelho, desde o primeiro dia até agora. E é exactamente nisto que ponho a minha confiança: aquele que em vós deu inicio a uma boa obra há-de levá-la ao fim, até ao dia de Cristo Jesus» (Fil. 1, 2- 6).
Com estas palavras saudava S. Paulo a comunidade cristã de Filipos, com as mesmas palavras quero saudar-vos a vós comunidade diocesana de Angra e dos Açores na qual peço que me acolhais, me ajudeis a integrar porque quero dela fazer parte.
Tenho a consciência de que me venho inserir na riquíssima experiência de vida cristã, desenvolvida ao longo de quase cinco séculos. Na presença do Senhor Dom António Braga, Bispo de Angra, a quem saúdo e desejo a melhor saúde para continuar a orientar esta amada diocese, e do qual tenho a alegria de ser seu colaborador, vergo-me perante uma plêiade de Bispos, presbíteros, consagrados e leigos que erigiram uma comunidade de discípulos de Jesus Cristo que ao longo dos tempos ofereceram uma fé lúcida e um empenho generoso para a edificação de uma comunidade diocesana activa e na construção de uma sociedade melhor e digna do ser humano.
Venho aprender de vós, irmãos e irmãs, a vossa riquíssima experiência religiosa que tão significativamente fostes forjando à volta da Trindade Santíssima, valorizando as Pessoas divinas de Jesus de Nazaré e do Espirito Santo, e integrar-me na vida concreta e bela do povo crente que bem sabe exprimir a sua fé. Peço com humildade que me aceiteis e que pacientemente me ajudeis a melhor servir-vos.
A vós sacerdotes, diáconos, seminaristas, consagrados e consagradas, leigos responsáveis e povo santo de Deus, a quem saúdo fraternalmente, aceitai o meu propósito de convosco formarmos uma comunidade que não tem outro propósito que servir a Deus e aos irmãos. Contai comigo, vosso irmão, para mutuamente e em espírito de entreajuda caminharmos numa identificação pessoal a Jesus Cristo totalmente entregue ao Pai, sabendo usufruir da verdadeira liberdade que nasce do mistério da entrega que transfigura e liberta.
Quero estar no meio de vós como quem serve.
Permitam-me que realce a comunhão sacerdotal que gostaria de edificar com os presbíteros como primeiro testemunho da alegria de quem segue a Jesus Cristo e oferece aos seminaristas a garantia de que vale a pena entregar a vida ao serviço do Evangelho, mas que é também para os jovens a certeza de que só em Jesus Cristo encontrarão a esperança e a alegria que procuram e merecem e que o mundo não pode dar. Dou graças a Deus pelos nossos sacerdotes, pelo nosso seminário e pelos jovens seminaristas.
Sinto-me igualmente interpelado na atenção a prestar aos que estão na diáspora, lutando por melhores condições de vida em terras estrangeiras, mas que continuam animados pela mesma fé e pela mesma devoção que souberam preservar em outros contextos humanos.
Transporto comigo o desejo de convosco caminhar nos apelos que o Concilio Vaticano II nos oferece exortando a edificar uma comunidade diocesana na comunhão e na corresponsabilidade entre todos os cristãos, e no forte desafio que nos é lançado pelo Papa Francisco a viver com coerência o Evangelho, a ser testemunha autêntica de Jesus Cristo e a servir os mais pobres e excluídos.
A missão pertence a todo o povo de Deus, assim o afirma o Santo Padre, convidando a uma Igreja toda ela ministerial e na participação de todos na evangelização do mundo.
Igreja de portas abertas e em atitude de diálogo sincero e humilde. É nesta convicção que me maravilho pela riquíssima cultura do povo açoriano.
A cultura moderna e postmoderna desafiam profundamente a Igreja. Estamos em tempos de profundas mudanças culturais. Assim o afirma o Concilio ao dizer que «a humanidade vive hoje uma fase nova da sua história, na qual profundas e rápidas transformações se estendem progressivamente a toda a terra (…) De tal modo que podemos já falar duma verdadeira transformação social e cultural, que se reflecte também na vida religiosa» (GS, 4).
A modernidade cultural portuguesa não se compreende sem evocarmos personalidades que, sendo açorianos e verdadeiros vultos da cultura portuguesa, ao longo dos últimos séculos contribuíram de modo singular para a evolução cultural e para a transformação da sociedade na qual a Igreja se sente envolvida e interpelada.
Com simplicidade peço que me aceiteis e que me integreis na vossa vastíssima e profunda vivência como povo dos Açores e que me deixeis usufruir da vossa riquíssima cultura.
Quero contribuir para a edificação de uma cultura digna do ser humano e por isso desejo colocar-me ao lado de todos os homens e mulheres de boa vontade que se dispõem a recolocar os fundamentos necessários para uma nova civilização que tenha a pessoa humana no centro, que atenda e dignifique a vida e a dignidade humana em todas as suas circunstâncias, recoloque a família na verdade sobre si mesma e promova a educação integral das novas gerações na esperança e na alegria.
O convite a saber discernir os sinais dos tempos, tal como se refere o Concilio, é uma interpelação pastoral para a evangelização do mundo de hoje. São muito lúcidas e fortemente interpelantes as palavras do Concilio quando dizem que «para levar a cabo esta missão, é dever da Igreja investigar a todo o momento os sinais dos tempos, e interpretá-los à luz do Evangelho; para que assim possa responder, de modo adaptado em cada geração, às eternas perguntas dos homens acerca do sentido da vida presente e da futura, e da relação entre ambas». E, conclui, sublinhando que «é necessário conhecer e compreender o mundo em que vivemos, as suas esperanças e aspirações, e o seu carácter tantas vezes dramático» (GS., 4).
Estou convencido de que a cultura para ser verdadeiramente humana exige a proposta do Evangelho. Por isso, eis-me disponível para em diálogo franco e comprometido pelo bem comum de toda a sociedade oferecer as razões da esperança cristã.
Porque sentimos que há franjas da humanidade que estão afastadas, colocadas nas periferias económica, social, cultural e religiosa, quero manter com elas uma implicação que não só as auxilie a assumirem um papel de promoção integral mas que ajudem a sociedade a saber olhar-se com novas prioridades.
É com o intuito de melhor servir a pessoa e a sociedade que me volto para vós Ex.mas Autoridades do Governo, Académicas, Militares, Autarcas, da comunicação social e de serviço público, para vos saudar e agradecer a vossa presença nesta celebração.
Admiro o vosso trabalho em prol do bem comum e reconheço a vossa preocupação pelos mais frágeis da sociedade. No respeito pela legitima autonomia da missão de cada uma das instituições, o serviço à pessoa e o bem comum da sociedade exigem que colaboremos na edificação da justiça, da paz, do bem, da solidariedade e da promoção integral da pessoa humana.
Se a Igreja reconhece que tem algo a oferecer à sociedade e à cultura, também é certo que ela tem muito a beneficiar na sua missão na escuta dos clamores que lhe vêm da parte do mundo onde vive.
É em clima de diálogo e profundo respeito pelas convicções e pela afirmação da fé de cada comunidade que quero saudar os responsáveis e membros de igrejas irmãs e de confissões religiosas diferentes. O diálogo ecuménico e interreligioso e a acção comum em favor da edificação de uma sociedade melhor convidam-nos a unirmos os nossos esforços na defesa da dignidade do homem todo e de todos os homens.
O Papa Francisco aviva a consciência evangélica da Igreja convidando a celebrar o ano jubilar da misericórdia para nos introduzir na experiência maravilhosa da misericórdia e do amor de Deus para cada um de nós, partilhá-la em comunidade e traduzi-la em gestos concretos em favor dos homens e mulheres do nosso tempo.
Sinto dirigido a mim o apelo do Santo Padre quando diz que «precisamos sempre de contemplar o mistério da misericórdia». Porque ela «é fonte de alegria, serenidade e paz». Ela é condição da nossa salvação.
Usando as palavras do Papa Francisco, também gostaria de afirmar nesta hora que «Misericórdia: é a palavra que revela o mistério da Santíssima Trindade; é o acto último e supremo pelo qual Deus vem ao nosso encontro; é a lei fundamental que mora no coração de cada pessoa, quando vê com olhos sinceros o irmão que encontra no caminho da vida; é o caminho que une Deus e o homem, porque nos abre o coração à esperança de sermos amados para sempre, apesar da limitação do nosso pecado» (Cfr. Misericordiae Vultus).
Permitam-me que convide a fazer deste acontecimento a oportunidade em que sentimos o apelo, de maneira ainda mais intensa, «a fixar o olhar na misericórdia, para nos tornarmos nós mesmos sinal eficaz do agir do Pai».
Porque «a arquitrave que suporta a vida da Igreja é a misericórdia», então, «toda a sua acção pastoral deveria estar envolvida pela ternura com que se dirige aos crentes; no anúncio e testemunho que oferece ao mundo, nada pode ser desprovido de misericórdia»(ib.).
Forte é a interpelação que nos é oferecida quando se diz que «a credibilidade da Igreja passa pela estrada do amor misericordioso e compassivo». E, ainda, a Igreja « vive um desejo inexaurível de oferecer misericórdia» (ib.,).
Termino agradecendo a presença do Senhor Núncio Apostólico e peço-lhe que apresente ao Santo Padre a minha admiração e comunhão com ele, agradeço a presença dos Senhores Bispos, do Senhor Vigário Geral, do Senhor Reitor do Seminário, dos Senhores Cónegos, membros do Colégio de consultores e Ouvidores, de Sua Ex.cia o Senhor Representante da Republica, da Ex.ma Senhora de Sua Ex.cia o Senhor Pedro Catarino, do Ex.mo Senhor Dr. Jorge Miranda, de Sua Ex.cia o Senhor Presidente do Governo Regional, de Sua Ex.cia a Senhora Presidente da Assembleia Regional, do Senhor Reitor Magnifico da Universidade dos Açores e demais autoridades académicas, das Exmas Chefias Militares e Forças de Segurança, dos Presbiteros, seminaristas e Diáconos, dos consagrados, dos membros de outras confissões religiosas e de outras comunidades cristãs, dos autarcas, dos homens e mulheres da comunicação social e de todos os fiéis leigos empenhados nas diversas actividades da vida da Igreja.
Dirijo uma palavra de especial reconhecimento e gratidão ao Senhor Dom António Francisco dos Santos, Bispo do Porto, ao Senhor Dom Pio, ao Senhor Vigário Geral da Diocese do Porto, aos sacerdotes e demais diocesanos do Porto que tiveram a amabilidade de se deslocarem até Angra para participarem nesta celebração. Uma palavra de muita gratidão pela presença dos meus familiares.
Peço a vossa oração por mim e pelo meu ministério e contai a minha oração por todos vós.
Eis-me humilde lavrador da messe do Senhor.
Dirijo-me a São Salvador do Mundo para que me abençoe e abençoe todos os açorianos e imploro a intercessão do Beato João Baptista Machado para que seja dócil à missão que Jesus Cristo me pede nesta amada diocese de Angra.
Volto-me para Nossa Senhora Mãe da divina misericórdia, Mãe e Rainha dos Açores que, em breve percorrerá a nossa diocese na imagem da Virgem peregrina, para que me acolha no seu regaço e me ensine a dizer na vida o sim forte e generoso capaz de transformar a face da terra.
+João Lavrador
Bispo Coadjutor de Angra